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Era uma vez um Pai...

Ultimamente o nosso genitor não tem honrado com os seus compromissos, não o vemos há meses e sabe-se lá por onde tem andado! Ouvimos através das más línguas que ele tem uma nova família e que é bem provável que esteja a cuidar dos seus novos favoritos. No princípio pensei que fosse matéria filosófica projetada pela minha mente sacana, até o momento em que o vi atravessar a Av. Maguiguana com duas crianças extraordinariamente parecidas comigo. Ou a minha mente era manipuladora demais, ou eu queria muito acreditar no que via… então ouvi-os chamar "papá" com tanta alegria, que quando dei por mim, igual àquele desconhecido, também sorria.

No princípio ele era a pessoa mais presente, protetora e genuinamente carinhosa. Dançávamos todos ao mesmo ritmo, os acordes suaves da valsa faziam de nós uma família quase perfeita, mas só nós sabíamos que ao fechar a cortina, todas as noites voltava para casa um homem diferente.

Paulatinamente suas atitudes começaram a vender suas más intenções a preço de banana e em segredo, vi nosso futuro virar insignificância. Os outros, sempre tiveram fé que aquela era apenas mais uma onda tsunâmica, causaria danos irreparáveis, mas que depois poderíamos novamente consertar. Enfim, agora estamos todos perdidos nos escombros, cobertos de constrangimento e ninguém tem coragem de se desabrigar. A verdade é que por mais que o seu corpo continue a vaguear sobre o nosso teto já quase inexistente, silenciosamente estamos cientes de que é só uma questão de tempo até que ele se torne apenas um fragmento das nossas cachimónias.

A vontade de vencer o amargor desse abandono abotoo o paletó quando ele finalmente fez as malas e tal como nos contos de rua disse: “Eu volto já meus tesouros, vou ali a esquina comprar cigarros”. O mais engraçado nisto tudo é que ele nem fuma e tal como os verdadeiros tesouros, permitiu que fossemos esquecidos em uma praia misteriosa chamada: lar doce lar. Hoje, somos movidos por uma esperança estéril, somos um conjunto frágil, fruto de um amor condicionado sem pré-aviso, provavelmente iremos desencarrilar vezes sem conta!

Tenho o coração partido, minha ideia de perfeição foi tragada por uma outra mulher que pouco se importou com os nossos sentimentos, mas bem sabemos que “quando um não quer, dois não fazem”. Enfim, onde quer que ele esteja, espero que lá o sol tenha um brilho mais intenso e que a vida não lhe dê a mesma quantidade de limões azedos que temos recebido desde que ele partiu.

Escrito por: Sheila Faiane



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