Salam papá,
Espero que nesse lugar onde te escondes estejas feliz,
mesmo estando longe de mim. Estou neste momento ajoelhada em frente ao pedestal
que fiz para ti, a contemplar a tua imagem que também coloquei em um
porta-retratos feito por mim, a tentar sentir a tua presença neste dia tão
especial.
Papá, hoje é o meu 18º aniversário e tudo que eu consigo
sentir neste momento é uma tristeza incalculável, pura nostalgia. Achei que ao
colocar-me aqui sentiria paz e ficaria mais calma, mas dói muito sentir saudade
do teu cheiro que eu não lembro, do teu sorriso, teu calor que eu não sinto
mais, do amor que eu sei que sentias por mim, dói muito papá. Enfim, eu sei que
se cá estivesses estaríamos aos pulos, aos abraços e beijos, deixaríamos a mamã
enciumada e este seria o melhor dia da minha vida. Mas infelizmente não temos
controle sobre o destino e o meu único desejo nunca vai se realizar.
Todas as noites eu vou deitar-me na esperança de poder
encontrar-te nos meus sonhos, tento até recriar memórias sobre nós dois, mas é
tudo em vão. Digo o teu nome em silêncio vezes sem conta, espero
inconscientemente por uma resposta, mas somente recebo de volta ecos de
lembranças que eu nem tenho mais certeza se são reais ou não. Confesso que até
hoje tenho tentado perceber o que a vida está a tentar ensinar-nos, se existe
alguém a quem eu possa culpar por te ter afastado de mim ou se realmente não
era suposto tu me veres crescer.
Enfim, allahu a'lam!
Na verdade, não sei se realmente interessa-me, só sei que tenho o coração carregado
de dúvidas e não consigo viver em paz com isso ainda que tente incansavelmente.
É controverso o que acontece no meu coração, será que algum dia saberei as
respostas papá? Tenho tido longas conversas com Allah, ele não me dá as respostas que preciso mas é nele que tenho
buscado forças para não cair na obscuridade dos meus pensamentos e para poder
manter-me firme o suficiente para sempre dar força a esta mulher que para toda
vida irá te amar, mas hoje eu não sei se ele será capaz de reconfortar-me.
Quero que saibas que deixaste marcas profundas aqui na
terra, jazakallah! Em nossa
casa só se fala de amor, vive-se amor, pois foi isso que nos ensinaste desde
sempre. Te foste tão cedo, tão cedo habituei-me a tua ausência, tão cedo
a vida cortou o nosso cordão umbilical, mas conheço-te tão bem e sinto inveja
do amor incondicional, da maravilhosa jornada que passaste do lado da mamã e do
jeito incrível como ultrapassaram vossas diferenças (sempre tu e ela contra o
mundo). Ela procura lembrar-me todos os dias que foste e sempre serás o grande
amor da vida dela, pura magia e então eu sinto mais saudade de tudo que não
vivemos.
Queria poder reinventar-te, curar o coração da mamã e
permitir que ela te ouça novamente a dizer que a amas, dançar contigo esta
noite e seguir a coreografia que eu desenhei em minha mente. Já consigo ouvir a música no fundo da minha mente:
“Back when
I was a child
Before life removed all the innocence
My father would lift me high
And dance with my mother and me
And then spin me around 'till I fell asleep
Then up the stairs he would carry me
And I knew for sure, I was loved”
Before life removed all the innocence
My father would lift me high
And dance with my mother and me
And then spin me around 'till I fell asleep
Then up the stairs he would carry me
And I knew for sure, I was loved”
Wallah billah papá,
eu prometo levar-te comigo por toda vida e do mesmo jeito que eu soube amar-te
sem te ter aqui comigo, os teus netos também saberão que tu foste um reflexo
inconfundível de amor incondicional. Mas, aqui e agora, enquanto estivermos
perdidos nesta conversa, dança comigo?
“If I could get another chance
Another walk
Another dance with him
I'd play a song that would never ever end
How I'd love love love
To dance with my father again”
Another walk
Another dance with him
I'd play a song that would never ever end
How I'd love love love
To dance with my father again”
Inshallah
papá,
eu sei que um dia te encontrarei nas estrelas e será mágico, verás como os
nossos sorrisos são idênticos, que levei a tua doçura e que sou tudo aquilo que
tu imaginaste que eu seria quando me viste pela primeira vez.
Ameen papá, até breve!
In memoriam: Ismail Puná (Isma)
Escrito por: Sheila Faiane
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