- Eu sei
que ele me ama. Eu sei que ele me ama. Tenho certeza que é amor” – Repito vezes
sem conta enquanto ele se prepara para dar-me mais uma bofetada. Nossa relação
é assim, uma mistura de amor e ódio, mas damo-nos super bem do nosso jeito
doce e picante.
Hoje
ele acordou bem disposto e manso. Fizemos amor como já não fazíamos há
muito tempo, foi como na nossa primeira vez, gostoso e intenso. Milagrosamente
tivemos uma manhã tranquila, tomamos banho juntos e ele até levou-me ao
trabalho.
Durante
o dia fomos trocando mensagens carinhosas com doces dizeres e muitas outras
coisas que eu não sabia que ele ainda era capaz de falar. Quando eu menos
esperava, chegou na minha sala um enorme buquê de dálias vermelhas (depois de
tantos anos ele ainda sabia que eu amava dálias), fiquei eufórica, não me
contive e mandei logo uma mensagem a agradecer pelo gesto. 1, 2, 3 horas se
passaram e ele não disse mais nada.
Quando
chegou a minha hora de ir para casa, achei melhor não ligar pois julguei que
ele ainda estivesse ocupado como sempre e talvez fosse melhor procurar um táxi.
Quando cheguei a recepção vi-o encostado ao balcão a flertar com a
recepcionista, mas aquilo também era normal (ele aparecer de surpresa e
fazer-se a outras mulheres na minha cara), por isso, mais uma vez engoli o meu
descontentamento e simplesmente dei um toque para que ele notasse minha
presença.
- Oh,
cá estás tu! Enquanto esperava por ti, perdi-me na conversa com este mulherão e
nem te notei — disse ele com um sorriso maroto a encarar a recepcionista. —
Vamos? Ou vem buscar-te o dono das flores?
Meu
coração gelou, fiquei perdida nas palavras que ele acabara de proferir e sem
saber o que fazer ou falar. Mas antes que fosse arrastada até ao carro pelos
cabelos, disse-o que já estava pronta. Quando saímos, quase mijei-me toda ao
ver o carro que ele tinha escolhido hoje: seu Toyota Mark X 250 RDS, jantes
pretas e vidros fumados. Eu já sabia que hoje a porrada começaria mais
cedo.
Enquanto
fazia a minha caminhada lentamente, senti sua mão se apertar mais em torno do
meu pescoço e percebi o sinal. Acelerei o passo. Mal entramos ele começou a
chamar-me nomes, puxou o meu cabelo, deu-me uma cabeçada e perguntou quem me
tinha enviado as flores.
- Eu
não sei amor — falei entre soluços e lágrimas — por favor pára, eu não sei!
Podia jurar que foste tu! Não faças isso, por favor.
Antes
mesmo que acabasse de falar, ainda mergulhada em lágrimas recebi um murro na
boca, meu lábio inferior começou a sangrar. Ele aumentou a velocidade ao mesmo
tempo que gritava, chacoalhava e batia minha cabeça contra o vidro do
carro.
Então
chegamos a casa, logo que ele desceu eu corri, corri pela minha vida e quando
achei que fosse conseguir escapar senti algo demasiadamente pesado bater em
minha cabeça. Imediatamente perdi a consciência.
Escrevo-vos
a partir do hospital, pois segundo a enfermeira que me tem assistido, fiquei em
coma por dois dias por consequência de um traumatismo craniano. Ela explicou
que o meu marido chegou desesperado no hospital, a pedir socorro e disse que eu
tinha sido assaltada na rua de casa. Só consegui chorar, pois somente eu sabia
o que havia acontecido e estava aterrorizada, mas ainda assim eu sei que ele
faz tudo por amor.
Quando
chegou o horário de visita, somente foi permitida a entrada da minha mãe (meu
pai há muito que se foi com outra mulher), porque o meu marido convenceu-me que
as minhas irmãs só querem estragar nossa relação, ordenou que não as visse mais
e eu obedeci. Quando minha mãe olhou para mim, não resistiu e chorou como uma
criança, implorou para que eu contasse a verdade...
-
Querida mãe, conheces a tua filha distraída, isto não foi nada. Sabes que a
minha rua é bastante perigosa e vamos apenas agradecer por não ter acontecido o
pior.
Ela
exaltou-se e perguntou o que podia ter sido pior. Disse-me com palavras amargas
que sabia o que estava a acontecer, pois os vizinhos tem acompanhado a minha
trajetória de pancadaria. Implorou que eu largasse o meu marido e eu demasiadamente
chateada disse que não e mandei-a embora. Mandei embora a única pessoa que
poderia salvar-me...
Quando
ele chegou, abraçou-me forte, implorou pelo meu perdão e como das outras vezes,
jurou que nunca mais ia tocar em mim. Choramos juntos, eu de medo misturado com
amor e ele de culpa (temporária)... eu perdoei. Ficamos assim por alguns
minutos, conversamos, ele ofereceu-me um colar de diamantes e disse que não via
a hora de levar-me para casa. Boba, Eu afirmei que também não via a hora de
voltar, mas esse
desejo só durou segundos, pois antes que ele fosse embora sussurrou no meu
ouvido:
-
Recupera-te, pois ainda tens de explicar-me sobre as flores. Amo-te muito!
Escrito
por: Sheila Faiane
Nota: O silêncio mata! Se também és vítima de violência doméstica ou sabes de alguém que esteja a passar por isso, porquê te calas? Denuncie! Procure ajuda:
AMMCJ – Associação Moçambicana das Mulheres de Carreira Jurídica
Maputo: Av. Romão Fernandes Farinha, nº 567, 1º esquerdo - Tlf/fax: 21408232 - Cell: 823173070 e-mail: ammcjm@gmail.com
Quelimane: Av. Josina Machel, edifício da OJM r/c Tlf: 24214987 Cell: 825609470
Chimoio: Feira Fepom - Cell: 827806160 mmoiane@yahoo.com.br Nampula: Av. do trabalho, atrás do edifício da arj Próximo do aeroporto - Tlf: 26218432
AVVD - Associação das vítimas de violência doméstica Escola comunitária 4 de outubro
Maputo: Bairro polana caniço - Cell: 847521098
LDH – Liga dos Direitos Humanos
Maputo: Av. Maguiguana nº 2219 - Tlf: 21 400412
Xai-Xai-Gaza: Bairro 10 –perto Comando Provincial Tlf: 28226627- 28225012
Sofala-Beira: Rua dos Pioneiros prédio sica-2º andar Tlf: 23329962 – 23322614
Chimoio: Av. 25 de setembro, - depois do prédio Manuel Nunes - Tlf: 25124120
Lichinga: Ao lado do Hospital Central - Tlf: 27120391
Tete: Av. 24 de Julho instalações da LAM 2º andar Tlf: 25222910
Quelimane: Av. das FPLM nº 1021- c. 123 Tlf: 24214742-24216501
Nampula: Av. Eduardo Mondlane c. 1026 Tlf: 26216562-26216561
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